de natal

"Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte "

poetinha

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

dia cinza

as vezes o buraco dá gritos enormes
amanheceu com os olhos cinzas, feito o dia.
"não perca a esperança nas pessoas"
sentia a alma vazar em cada encontro sem nexo
a"solidão somos nós, disfarçados de outros"

Depois de uma noite de trabalho, repleto de encontros com o nada. Resolveu caminhar na praia. Tirou os sapatos, sentia prazer em pisar aquele chão. Gostava de pisar no desconhecido. Um dia acreditou que o desconhecido eram os outros, eram os encontros, era o sexo ... aquilo se tornou tão repetitivo que lhe dava ânsia. Saíra de casa querendo trair, ser livre, envergonhar os pais. Quisera conhecer o mundo. O Outro. Esqueceu-se dela. Em sua ânsia de trair o outro, em se portar adequadamente a fim de lhe atrair esqueceu-se quem era. Usava a vida como palco de suas tragédias auto-programadas, em seus lutos inventados, em amores que eram só seus. Lembrou-se das frases que ouvira durante a noite ... "você é minha" ... "grite que é minha puta" ... "mande em mim". Apercebeu-se que a grande querela que surgia era o pertencimento. Não era o prazer, o gemido, o gozo ... era o dividir-se. Gostavam de mandar, de serem mandados. De estar dentro e ser um. De não ser apenas deles mesmos. E com esse emponderamento sofreu. Não conseguia mais estar ali, passou a ser uma ceifadora. Com seus olhos cinzas, via o vazio daquela busca por divisão. Eles não percebiam, estavam com os olhos fechados, contemplando o delírio da perfeição. Ela quase sentia inveja. Mas antes vinha a leveza do nada.
Olhando para o mar. Bem, agora sim um desconhecido. Atração. A traição agora sim faria sentido. Percebeu que no fim, a traição era para com ela. Esconder-se no outro. Não conseguia mais. Mas o mar ... esse sim a atraía. Com seus olhos cinzas, viu-se ridícula e o mar tão lindo. Sentia-se suja. Tirou a roupa. Não espera-se grandes pudores as 4 da manhã. Nua, cinza, pura. Correu. Foi ao encontro do desconhecido. Agora convencida de que estava realmente traindo alguém.

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