"É
só na sexualidade que o milionésimo de dessemelhança humano aparece como uma
coisa preciosa, pois não é acessível em público e é preciso conquistá-lo. A
sexualidade prossegue sendo ainda o cofre de prata em que se esconde o mistério
do eu. Não era, portanto, apenas o desejo do prazer (este surgia como prêmio),
mas o desejo de se apoderar do mundo (de abrir um corpo mostrado ao outro, como
com um bisturi) que o levava a conquista." Kundera - Insustentável Leveza do Ser.
Saiu com um moço, em uma
segunda-feira aleatória. Duas horas de um papo cheio de confidências ainda mais
aleatórias. Ficou se perguntando porque esse homem aparentemente tão grande,
estava ali na sua frente contando tantas fraquezas, que pareciam tão doídas.
Logo se assustou. Gostou. Sempre avaliou a exposição de si mesmo como algo
bonito. Sensual. E, a partir dali, já o viu nu.
Beijaram-se depois de duas
horas de conversa. Ela já acreditava que não iriam, que as coisas não
iam sair daquele ponto. Mas saiu. E entrou. E deu voltas. Sentiu já um bom
saudosismo antecipado, que sempre surge fomentado pela elaboração de boas
memórias: quando ele a beijou a primeira vez e sem pudor colocou o dedo em sua
boca já sugerindo o que queria para aquela noite.
"Taurinos são um negócio
que acabam comigo"- pensou. E já no bar começaram a transar. Aproveitando
a falta de pessoas em um bar aleatório em uma segunda-feira, começaram ali. Entrou
no banheiro, ele atrás. Não fizeram tanto, apenas o sentir do corpo todo e por
inteiro os fazia gemer e pulsar. E pulsava, latejava em cada lambida carregada
de desejo. Tesão. "Caralho, esse homem tá me desmontando toda" -
ainda conseguia pensar. Mentira, não chegava nem a pensar. Apenas sentia o toque daquele
desconhecido estrangeiro, forasteiro, maldito ...
A cada toque um alto gemido.
Sentia-se emponderada de um corpo que desconhecia, mas que a obedecia. O pulsar
de um tesão que surgiu do nada, que trouxe tudo, que nada perguntou ... mas que
se instalou como um maldito posseiro. Assustados com a chuva, o vento e as
pessoas. Saíram do banheiro. Molhados de chuva, fluídos e vontade. Sentaram-se
obstinados à voltar pra casa.
-
São onze horas da noite de uma segunda, preciso ir pra casa, trabalho amanhã
cedo, meus pais já me ligaram quatro vezes ... - disse isso tudo ainda
assustada pelo o que aconteceu.
Bêbados às onze da noite em uma
segunda-feira, sem destino e guiados por uma mão. A outra a tocava, a
masturbava, quase que lhe gozava ... chegaram à casa com ela quase gozando.
- Eu prometo
te deixar em casa ainda hoje.
"Que
porra tem nesse homem que eu obedeço ele? Foda-se o amanhã, hoje eu só quero
que ele esteja dentro de mim."- consciente da confusão que aquilo
causaria, apenas foi.
- Eu só quero que tu goze na minha boca.
Só isso, depois tu vai embora.
Terça-feira (08:00)
- Camilla, ontem eu transei com um homem
desconhecido que eu não faço ideia nem de qual seja o mapa astral dele. Eu
nunca tinha feito isso na vida. Eu só sei que pra onde ele quisesse me levar,
eu iria. E o caralho é que eu não consigo parar de pensar nesse homem. Que
porra é essa, cara. Tira esse demônio da minha cabeça, por favor.
Quinta (16:20)
- Júlia, ele não fala comigo. E isso é
normal. Mas o odioso é que eu me importo. Eu tenho estado com tanta gente,
tenho cuidado em não me importar com ninguém. E esse taurino do demônio sumiu.
Sumiu! E isso me irrita infantilmente.
- A gente tem 25 anos, mas quando leva um fora se
sente com 8 anos quando o menino que a gente gosta nos nega um biscoito.
Sexta-feira (23:00)
Escreveu:
"Quantas horas serão necessárias para te tirar da minha mente,
homem?
Quantos banhos serão precisos para tirar o teu cheiro que insiste em
ficar impregnado dentro de mim?
Quantas noites catárticas permeadas de sonhos, gozo e gemidos serão
suficientes para te arrancar dos meus devaneios?
A minha respiração e pulsar seguem entranhados de você, desde que você
entrou em mim e me atravessou, me comeu e, sim, me engoliu.
Agora sigo aqui fazendo parte de você, contigo gritando dentro de
mim."
Sábado (08:00)
Que homem de merda.
Que angústia de
merda.
Mas essa dor ao menos valeu um texto.
Segunda-feira(19:00)
- Oi, vamos se
ver?
- Oi ... vamos.
- Chego na sua
casa em 15 minutos.