de natal

"Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte "

poetinha

segunda-feira, 2 de julho de 2018

Das coisas que adoro em você.

A distância, as vezes, tenta limitar aquilo que nos surge em âmago.  Mas mesmo o tempo sendo um amigo precioso e um inimigo voraz, as vezes  -só as vezes- este se coloca como catalisador, quando atravessado pela vontade.
Vontade:
Querer liberta: eis a verdadeira doutrina da vontade e da liberdade – assim Zaratustra ensina a vós […] Para longe de Deus e dos deuses me atraiu essa vontade; que haveria para criar, se houvesse – deuses! -Nietzsche

- Eu lembro, com nitidez, da primeira vez que você entrou em mim.

- É o quê, Julieta?
- É sim, Josué. E não foi com sexo. Foi com a palavra.
- Como assim, mulher?
- É assim, palavras. Foram elas que trouxeram a gente até aqui. Foram elas que fizeram a gente se mostrar. Mostramos a alma,o afeto e o corpo. E todas minhas tentativas de me afastar de ti: serviram de nada. Mas com uma coisa tu vai concordar, a gente começou a transar antes do encontro.
- Tu acha isso?
- Sim, antes do beijo. Se bem, que você me comeu na primeira vez que pegou na minha coxa. Naquele bar vazio, em plena beira mar.
- Comi?
- Comeu e deixou molhada. Eu já cheguei sabendo que era sua.
- E é.
- Sou, fácil assim.
- Apesar que a facilidade nunca nos encantou, né baby?

O inefável, indizível e intransponível as vezes se colocam entre entes de modo sedutor e inebriante.


-Gabo, bem que disse "todos na vida temos uma quantidade limitadas de trepadas, se perdeu de ter uma, é uma foda a menos"

- Ele disse isso?
- Tipo isso.

Os encontros da vida são assombrosos.

Os desencontros temerosos.
Os amores imperdíveis.
As decepções indecorosas.
Mas e as fodas?



Após mais uma despedida, ela carrega, uma mala com: neosoro, lenço umedecidos, documentos, parco dinheiro e uma carta para entregar, que diz:




"Olha, meu amor, tem um poeta que diz que saudade existe pra quem sabe ter. Mas eu não tô sabendo mais ter saudade não. Saudade é boa, mas dói. E, honestamente, eu nem concordo muito que esse poeta ai não, sou mais meu Luis Gonzaga que diz que quando a gente vive a sonhar com alguém que a gente deseja rever, ai é ruim, meu nego. Amarga e é de ruim. Eu tô te escrevendo isso, pra te avisar que tô entrando na tua vida, que a saudade tá doendo, que eu vivo e morro por tu. Mas que eu tô aqui. Cheia de vontade. Dorme com esse bilhete, tem meu cheiro nele. Aquele que tu gosta. Da tua morena."

e assim renasce Julieta.

julho de 2017.

domingo, 13 de maio de 2018

mas o tempo é acaso precioso

Quando o homem se deita sobre o útero dela, ela é preenchida, cada ato de amor, ter o homem dentro dela, um ato de nascer e renascer, carregar uma criança e carregar um homem. Toda vez que o homem deita em seu útero se renova no desejo de agir, de ser. Mas para uma mulher, o climax não é o nascimento, mas o momento em que o homem descansa dentro dela.

Anaïs Nin



O tempo nos enrosca em voltas imensas e nos coloca em acasos até bonitos. Após anos colegiais, encontraram-se no indecoroso benfica. Bar verde, cigarros acesos, cervejas derramadas, decote mostrando ao que veio. Já saiu de casa com a calcinha de renda, devidamente cuidada, precisamente molhada. Esperava. Algo ou nada. Estava lá. Como poucas vezes: disposta. 

Disposição é artigo raro em mundo dado a pequenos e voláteis encontros. A intensidade brotou com o enroscar de línguas, suspiros em gemidos, mãos apertando o corpo, desejo gritando vontade. Vontade gritando precisão. Precisão que suplica audácia e os colocou nus em frente ao outro em menos de uma hora. 

O encaixe as vezes surge com precisão de inicio. Evento raro. Mas, ocasionalmente, o estar dentro surge como lar. Recipiente que pinga por mais, geme por mais, treme e pulsa por um incessante mais. 

O gozo surgiu como um ápice de súplica por uma eternidade do entrar e sair. 

De quatro encontrou pose. Posição. Lugar de falo. Lugar de puta. Lugar de mulher. Ao rebolar sentiu-se santa. Sentiu-se dona. Percebeu-se domada. Lugar de centro, lugar de fala, lugar de falo.

O gozo. Mais uma vez como vontade incessante.

Sentada encontrou poder. Colocada por cima. Em cima do que queria. "Eu sou uma mulher e hoje eu só quero trepar." É surra de buceta que chama? Surra nada, era carinho, era desordem, era organização. Era vontade de sentir dentro e saber que o papel de colocar dentro era seu. Brincava poderosamente de tirar, botar, sentar, rebolar, colocar, arranhar, beijar, chupar.

O gozo. Cansado e permeado de realização. Realização?! 

Ainda molhada de vontade que pingava aos dedos. Ele posto de desejo que penetrava a alma. Os olhos colocados de deleite. Enseados de voracidade. Mais uma vez dentro, dentro de si. Já nem sabia mais como seria não estar com algo dentro de si, depois de horas de completude entre as pernas. Questionou o tempo ao ver o dia amanhecer em forma de lembrança de uma voraz e loquaz realidade que a coloca em frente ao inevitável fim do gozo.

"Essa noite vai me render texto" - despediu-se. 

O fim que surge nos coloca em frente ao inevitável adeus, mas as vezes este consegue fomentar a poesia.

princesa do meu lugar

Em uma garrafa de cerveja e um cigarro encontrei deus,
Com a percepção do infinito e da grande imensidão
Me alegro.
De tanto mundo, deve haver sim um lugar que me caiba.

Com os desencontros, observou o encontro de si, encontro de águas, de muitas, de indesejados sentimentos que são seus (mas nem sempre). Após o encontro com vários homens que recusavam-se entrar no mar, resolveu que o mergulho haveria de ser com base na solitude. Sozinha iria ao fundo, sozinha retornaria das águas.Renasceria. Como uma madona azul e triunfante, que sabe das incomodas areias que traz nos  pés, das algas penosas que carrega. Modorrenta de si mesma, exausta. Mas retorna, atravessada de suas dores. Carrega consigo o prazer de ser sua. De não precisar caber em lugar nenhum, ela dona de si mesma. Pra ela, basta caber em si.

terça-feira, 17 de abril de 2018

Ansiedade

O peso de ter de ser eu mesma durante o resto da vida é duro e desejável de abdicação.

Junto com as nuvens cinzas a ansiedade recai sobre meu corpo e faz dele moradia. Com uma triste agonia silenciosa. Que se junta com a vontade de automutilação. Vontade de arrancar de mim a dor e o peso de ter de encarar a vida sendo exatamente o que consegui ser. Uma dolorida. Pecadora. Abusada. Incapaz de ser amada e irremediavelmente sozinha.

sexta-feira, 13 de abril de 2018

Uma carta para 2015

Querida Erika,

O mundo vai girar e se desfazer por entre teus pés e visão. Tanta coisa mudou. O medo continua te sendo companhia durante a maior parte do tempo. Mas te olhando daqui, nessa casa grande, marrom e cheia de vento, eu consigo lembrar que você, em muitas vezes, teve certeza que não conseguiria. Mas você conseguiu. As mulheres que você um dia viu como disputa, te foram solo, adubo e sol. Elas te mudaram. Mas não foi fácil. Você pensou que morreria quando teimou em enfiar as coisas naquelas bolsas improvisadas, e sem dinheiro nem comida ... apenas ir. E depois ... o quanto foi terrível, ouvir que o esforço pra te amar é grande e ainda assim improdutivo. O amor te bateu tantas, tantas vezes. O amor bate? A vida te bateu mais do que pensou aguentar. Mas você aguentou. O fundo do poço que tanto te acompanhou, tornou-te lar. Aprendeu a crescer em lugares inóspitos. Aprendeu a sofrer. Mascarar o medo. Você cresceu. E assim o mundo encolheu e ficou cada vez mais difícil encontrar um lugar que te caiba. Um abraço que amenize sua dor. Uma pessoa que saiba lidar com a sua força. Você precisou matar e destruir coisas demais, pessoas demais, sentimentos demais para poder ressurgir. "Parece uma fênix" - te dirão. A vida segue pesada, seu corpo sobrevive, mas adoecido. Mas a vida segue. Torta. Injusta. Dolorida. Mas dona de si. Emponderada do seu lugar. Hoje ninguém é capaz de te tirar o prazer que é poder simplesmente ser você. O preço é caro, mas nenhum preço é caro demais pra poder ser a mulher que você lutou, sangrou, morreu, ressurgiu, mas que hoje se tornou. E assim mesmo com tanta dor, ódio e pesos você vai aprendendo que até mesmo a mais dura rocha pode aprender a florescer.

sexta-feira, treze de abril de 2018.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

O ser mulher


Vocês tentam com afinco me convencer que ser mulher é uma dádiva. Um dom de vida que me foi dado. Mas me desculpem, mas eu não vejo isso. Ser mulher é um peso que me jogaram sem eu ter pedido. Olhe, moço eu concordo que você entende de muita coisa, mas não tente me convencer que devo ser feliz por quem sou. Preste atenção, eu fui estuprada, abusada, humilhada e cotidianamente diminuída sob o argumento "mas você é mulher". Sinceramente, me desculpe mas isso não tem me parecido vantajoso. Crescer sobre a égide de ser diminuída simplesmente por ser quem sou. Por vestir um corpo que eu inclusive odeio. Não, não! Você nunca vai me convencer que isso é bom. Honestamente, até o fim eu vou gritar. Me deixem lamentar. Me deixem gritar. Porque nada disso me parece minimamente justo.